segunda-feira, setembro 25, 2006

OS ÍNICIOS DE UMA VIDA, PARTE II

Sem ter uma primeira parte, o título deste post faz todo o sentido… Porque todos nós temos segundos inícios, segundas chances, segundos começos de vida. Todos nós, algures ao longo do livro que é a nossa vida, viramos uma página para começar um totalmente novo capítulo. É uma das maravilhas dela mesmo, da vida.
Ao acabar o secundário todos nos encontramos, invariavelmente, numa encruzilhada desse tipo. As perguntas catapultam-se nos nossos cérebros e somos sobrecarregados com informações e, consequentemente, com dúvidas.
Devo continuar a estudar? Estarei a cometer um erro? Deverei ficar? Deverei ceder? Deverei forçar? Será que dura? Será que me ama? Será que…?
Os conselhos não faltam. São os pais, que nos querem ver a trabalhar (seja na Universidade ou na padaria mais próxima). São os amigos que nos querem para sempre ao pé deles, num bar ali perto ou no mesmo curso que eles. E somos nós, que nos tentamos continuamente aconselhar pelo melhor.
Aprendi, que por vezes o melhor é fazer orelhas-moucas a todos eles. Aos conselhos e às pessoas, mesmo a nós próprios. Por vezes há que fechar os olhos e seguir, apontado o caminho com um dedo, como se fossemos uma bússola viva do nosso destino.
Não ninguém a quem culpar por aquilo que correr mal, nem mesmo a nossa própria consciência, que foi ignorada ao longo do caminho. O que é alias muito plausível, visto a nossa consciência ser sempre um espelho daquilo que os ensinaram e pelo qual nos moldaram ao longo do tempo. Fechando os olhos e os ouvidos estamos apenas a perscrutar os nossos instintos, as nossas premonições. Consequentemente estamos a preparar-nos para uma vida na qual não nos poderemos sempre apoiar nos conselhos dos outros – por vezes até mal intencionados - e temos que nos guiar, meios bamboleantes pela vida.
Se por um lado me sinto uma verdadeira equilibrista, nada me dá mais orgulho do que a noção de estar sobre a corda bamba. Alguns olhares atentos me perseguem. Tantas expectativas e cepticismos postos sobre mim… Mas nada disso tem a menor importância, porque, enquanto equilibrista, estou apenas concentrada na estabilidade do meu percurso. E continuo, com a noção que cada novo espectador é mais um admirador a conquistar.
Quando olho à minha volta, para além do público, há ainda os meus colegas, todos os outros jovens acrobatas, que se equilibram sobre trémulas bolas ou que fazem malabarismos com o fogo. Imagino que não se devam sentir muito diferentes de mim, neste circo. Cada um segue o seu número, cativando e maravilhando o seu próprio público. Somos todos artistas de palco. Seres audaciosos que se lançaram na vida pelos caminhos mais, ou menos, tortuosos. Admiro-os, mas sei, que cada número é inimitável e que cada um tem que seguir o seu caminho.
Assim sendo, volto a focar o meu objectivo: chegar à outra ponta sem cair e nada mais me impede de o fazer como eu quero. Posso até extravasar e, em momentos de pura inspiração, incluir uma pirueta ou um salto, no meio do meu percurso.
Nada me assusta… pelo menos por enquanto. E quando o fizer, relembro-me que já percorri metade do obstáculo e a segunda metade não será diferente, nem mais difícil. E mesmo que o seja, há sempre a bendita rede lá em baixo!

In-socializar, um problema inerente em todos ou s'o em mim?

Para que o leitor compreenda um pouco melhor o conteúdo deste post, há que voltar atrás no tempo, à época em que eu não passava de uma cachopa, sem muito que contar.
Nunca fui alguém muito sociável. Bem o queria ser, contudo, as condições que impunha a mim mesma para fazer qualquer tipo de amizade eram tais, que acabava sempre por pouco ou nada socializar com muitos dos meninos que me rodeavam.
Pelo pouco que me lembro não era assim de início, mas lembro-me de, ao entrar na escola que me durante catorze anos, achar todos os meus colegas, simplesmente estúpidos. Eram todos, quase sem excepção, “meninos-bem”, com nomes compridos e inpronunciáveis e impunham nos seus joguinhos infantis regras que me pareciam absolutamente inaceitáveis. Lembro-me de um jogo em particular, que se baseava em mostrar as cuequinhas (na época, tudo inócuo e cheio de bonecos da Disney). Parecia-me impróprio, ridículo e nunca quis compactuar com tais atrocidades. Era algo menosprezada e passava grande parte dos intervalos num canto do jardim a murmurar coisas imperceptíveis para mim mesma. O facto de falar sozinha nunca ajudou muito nas minhas relações inter-pessoais… De qualquer maneira, as premissas que impunha na época pouco diferem das que imponho agora: pessoas que sejam minimamente inteligentes, minimamente sensatas e sem macaquinhos no sótão. Ou seja, pessoas com quem possa ter uma conversa decente, sem ter que ouvir de repente uma patacoada fascista ou uma bácora elementar.
Diga-se de passagem, ainda hoje não entendo como consegui arranjar tão bons e perfeitos amigos, quanto os que tenho. Não serão dúzias, mas poucos também não são, ou, pelo menos, para mim chegam, porque se são poucos são dos bons e isso é dizer quase tudo.
Nesta coisa do aprender a ser social, a socializar, nunca fui muito boa aluna. Sempre encaixei numa data de estereótipos fatais em qualquer escola. Era gordalhufa, caixa de óculos e sabichona. O mais curioso, é que, apesar de ser um desastre em relações públicas com indivíduos do meu tamanho, não tinha papas-na-língua quando se tratava de pessoas mais velhas. Há até uma anedota lá em casa, em que, pelo que se conta, me terem ido buscar à festa de uma amiguinha e eu estar, ao contrário do outros meninos que jogavam às escondidas ou algo do género, a conviver animadamente com os pais e avós da aniversariante. Uma velha professora minha acrescenta ainda, que, não estando eu ainda sobre a sua tutela, já a abordava recontando – e nunca percebi bem o propósito disto – os mais recentes episódios da novela em horário nobre. Eu devia ser, de facto, uma criança algo dissemelhante…
Os problemas de comunicação e relacionamento imediato continuaram. Lembro-me perfeitamente de odiar – na perfeita ascensão da palavra – brincar com os outros meninos na praia. Se me vinham com aquela velha abordagem do: “Queres brincar comigo?” – a resposta era sempre, invariável e redundantemente: “Não!”. Sem quaisquer cerimónias. Preferi muitas vezes estar só comigo, assim em-mim-mesmada, do que com outras criancinhas, que eu desde sempre – e ainda hoje – acho tremendamente irritantes.
Era aquilo que os adultos consideram uma criança ajuizada, uma menina bem-comportada, uma rapariguinha calma. Todavia, e contradizendo tudo aquilo que eu exteriorizava, o que eu mais queria era ser popular. Talvez este desejo não se tenha revelado logo aos quatro ou cinco anos, quando abominava os queques do meu colégio, mas ao entrar na adolescência apercebi-me muito rapidamente disso. Mas, lá está, as minhas condições continuavam as mesmas e não era por me sentir associal, que iria passar a conviver com qualquer besta que se me pusesse à frente.
A minha timidez foi sendo maquilhada com toneladas de exibicionismo furtivo, com uma persona ruidosa e tagarela que eu interpretava na esperança de alcançar um público que me aprouvesse. Até certo ponto fui bem sucedida, mas iludi muita gente também, que hoje me toma por uma pessoa prá-frentex e arrojada, quando continuo a ser, bem cá no fundo, a envergonhada Joaninha.
Ao longo da minha, ainda, jovem vida, fui aprendendo truques e passos, pelos quais me orientei para socializar. Apercebi-me que sou um pouco como um horrível necrófago. Muitas vezes aproximo-me de pessoas mais fracas, com maiores probabilidades de me aceitarem, tudo para não fiar sozinha. Depois, lentamente, acabo por me aproximar dos outros, dos normais, dos populares, e aí tornar-me até um deles, alguém com nome, alguém acompanhado. Os fracos, os primeiros degraus, acabam por ser deixados para trás, como restos, restos que eu já fora também. Para minha sorte, apercebi-me de que este processo se ocasionava apenas em relações de curto prazo, em situações nas quais me via coagida a relacionar-me e não tinha outra escolha senão começar pelos elementos mais fracos da cadeia. Com as minhas relações a longo prazo, relações pelas quais não tive que fazer qualquer esforço hercúleo para as obter, nada disto é uma realidade e ainda bem.
Por norma todos aqueles que me conhecem dizem ter tido a princípio uma ideia completamente diferente de mim. Já me disseram que me achavam um bicho-de-mato, que eu vim mais tarde a revelar não ser. Já me contaram que a princípio me tomaram por uma presunçosa, megalómana e histérica, sendo essas mesmas ideias mais tarde refutadas ao me conhecerem melhor.
O pior, como muitos leitores irão atestar, é sem dúvida o início. Como começar uma conversa sem que acabe num silêncio morto? Como relembrar os nomes dos outros e fazer com que se lembrem do nosso? Como fazer com que nos achem interessantes e voltem a falar connosco sem ser para nos dizer para sairmos da frente?
Como posso não me sentir tão mínima e invertebrada, quando ouço as pessoas lá fora, do outro lado da porta do meu quarto, e não tenho a mínima coragem para as abordar? Gostava de lá ir e, com o melhor dos meus sorrisos, dizer muito calma e despretensiosamente: “Hello! I think we haven’t been properly introduced. I’m Joana? What’s your name?”.
O leitor pode transpor esta situação para qualquer outra na qual se encontre na imposição de socializar o mais depressa possível – imagine-se uma festa importante na qual não conhece ninguém, um jantar no qual estamos isolados entre desconhecidos e não queremos apenas mastigar, ou um work-shop no qual nos sentimos ignobilmente ignorantes e não queremos expor a nossa questão para um público maior que o nosso colega do lado.
Acho que, inevitavelmente, todos nós num momento ou outro nos sentimos uns incapazes em matéria de socialização. Mesmo aqueles que tomamos por sociais natos se perguntam inúmeras vezes como abordar uma pessoa ou como não se sentir tão sozinho numa sala tão populada. Judith Martin disse uma vez: “«What shall I wear?» it’s society’s second most frequently asked question. The first is «Do you really love me?»”.
Todos enfrentamos o consecutivo medo de ficarmos sozinhos e de sermos postos de parte; o medo de não nos quererem ouvir e de não nos darem o devido valor; o medo de sermos considerados uns fracos ou pior, uns fracassados!
Instinto natural do animal que ainda somos. E como qualquer animal de manada, não subsistimos sozinhos. As várias experiências feitas ao longo do século XIX provaram que os recém-nascidos criados sem afecto, apenas com alimento e higiene básicos não sobreviveram. Os párias da Idade Média enlouqueciam mais cedo ou mais tarde com base na sua expulsão da sociedade. O suicídio era uma causa de morte comum entre os primeiros habitantes do deserto Texas, onde eram precisos alguns dias até se encontrar outro Ser-Humano.
Não tenho medo de enlouquecer, sei, por experiência própria, que mais cedo ou mais tarde estarei por aí aos pulos com todos os outros, não tendo tempo sequer para aquilo que devia, de facto, estar a fazer. Só não gosto de ficar à espera das oportunidades ou das brechas para as criar. É uma espera muito entediante e, principalmente, muito solitária.

quarta-feira, setembro 20, 2006

Até Já!

Eu volto loguinho, prometo!
Vão escrevendo!
*

segunda-feira, setembro 11, 2006

"Já não sei ir para casa" ou Como a Inovação é feita e acolhida em Portugal

A cidade fervilha, borbulha, quase que explode. Não apenas porque a maioria dos lisboetas acabaram as suas feriazitas no Algarve e porque o ano escolar recomeçou, mas porque a Carris - a companhia de transportes mais antiga de Portugal - mudou as carreiras, introduzio outras novas e modificou a vida dos pobres utilizadores de autocarros.
Acabo de voltar ao país, para me deparar com o caos que se gerou entre os utentes baralhados, turistas desconfiados e inseguros ao entrarem nos autocarros juntamente com um magote de gente bramindo descontentamentos e funcionários incapazes de manter a ordem.
Contudo, esta história não é apenas mais uma anedota à portuguêsa. Tem mesmo muito mais que se lhe diga. E se há muita coisa que corre mal e me parece absolutamente inusitada, também há outras tantas, que foram muito bem estudadas e merecem, provavelmente pela primeira vez, a minha absoluta concordância e admiração.
A Carris não implantou apenas uma nova rede (a que chama: Rede 7), fez também extraordinários progressos a nível de recursos humanos, estudo do cliente e, muito claramente, a nível de marketing. A Rede 7 está, de facto, bem estudada, estructurada e abrangente. Quis ter toda a informação possível e fiquei a saber, que a Carris efectuou um estudo demográfico e evolucional-urbanístico da cidade de Lisboa, do qual resultam as novas carreiras e as alterações de algumas mais antigas.
Parece que vejo - e parece milagre - os fundos europeus a terem o uso correcto!
Desde bilhetes electrónicos, passando por métodos de identificação dos veículos mais compreensivos, até empregados mais bem certificados, as filas intermináveis de espera e as horas gastas em carreiras que apenas passam a cada quarenta e cinco minutos parecem ter acabado.
Contudo, cheira-me que nesta terra tem que haver sempre algo que estrague a festa.
No meio de tanta inovação a Carris parece ter-se descuidado na informação dos seus clientes. Bem sei que está tudo muito bem explicadinho no site (www.carris.pt), mas ter-se-ão esquecido, que uma grande parte dos seus clientes tem mais de 60 anos e não tem ou não sabe trabalhar com a World Wide Web? E mais, para além destes clientes, há também estrangeiros residentes em Portugal, crianças pequenas e utentes ocasionais, que não andam por certo constantemente a par das alterações da empresa.
Acabei por constatar que a anulação de certas carreiras prejudica muito mais gente do que de início imaginei. Sei, pelo meu próprio bairro, que algumas alterações não foram discutidas com as autarquias afectadas. Apercebemo-nos todos, utilizadores assíduos da Carris, que as mudanças implicam também, por vezes, mais transbordos, mais tempo nos percursos e a não solução do já costumeiro síndrome-das-sardinhas-em-lata, que se verifica nas horas de ponta e nas carreiras mais populares.
Se por um lado algumas carreiras acertaram na mouche, a aniquilação de outras confunde e prejudica muitos lisboetas.
Parece-me também que a informação tem sido mal dada e a altura muito má escolhida, com pessoas a virem de fora, miudos em reentrée e uma temperatura que não ajuda a têmpera de ninguém.
Quanto a mim parece-me, que a incisiva alteração de carreiras tão conhecidas e importantes quanto a do 27 foi algo de demasiado drástico a fazer. O bairro da Lapa, por exemplo, passou assim a ter apenas uma carreira de autocarros (que só faz o precurso interno) e duas carreiras de eléctricos. Facto que deixou a junta de freguesia em polvorosa e que teve como consequencia a imposição de um processo por parte da mesma.
De qualquer maneira posso afirmar, conquanto que de um modo algo egoísta, que as novas carreiras e todas as alterações terão, na medida do possível, as suas agradáveis repercursões em breve. Mas, como tudo o que é novo neste país, são aceites com desdém, cepticismo e má vontade.
Estranho, esta gente que tem a mania dos provérbios e das lições de moral ainda não se tenha lembrado do ditado: "Há males que vêm por bem!"
(e eu concordo)